Virou versão corrente para a nata da extrema direita brasileira que Jair Bolsonaro (PL) ficará no Complexo Penitenciário da Papuda por apenas uma semana, ou menos do que isso, para depois ser colocado novamente em prisão domiciliar. A hipótese, que é dada como certa por seus correligionários, estaria cada dia mais ganhando força, sobretudo pela maneira como a história é contada e propagada por colunistas da imprensa corporativa. No entanto, a situação não seria tão simples quanto se afirma.
A Fórum apurou que um retorno do ex-presidente condenado para sua mansão no condomínio fechado do Jardim Botânico, em Brasília, não é “automática” e fácil” do jeito como seus aliados disseminam, especialmente porque o relator de sua ação penal, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, não estaria disposto a aceitar qualquer desculpa esfarrapada da parte dos médicos e advogados do líder extremista.
Toda a tese de retorno de Bolsonaro para casa se sustenta no caso do também ex-presidente Fernando Collor, condenado a oito anos e dez meses de prisão e que ficou sete dias numa ala especial do Presídio Professor Baldomero Cavalcanti de Oliveira, em Maceió, capital de Alagoas, para então ser autorizada pelo Supremo sua prisão domiciliar. Ainda que existam semelhanças entre as situações, por envolverem ex-presidentes da República, há ainda muitas diferenças, começando pelo fato de Collor ter 76 anos, ao passo que Bolsonaro tem 70. Na sequência de disparidades, há ainda o fato de o primeiro ter sido condenado a uma pena três vezes e meia menor que a do último ocupante do Palácio do Planalto, além de ter comprovado em seus laudos sofrer de Parkinson.
A doença de Parkinson é um distúrbio neurodegenerativo crônico e progressivo que afeta principalmente o sistema nervoso central, causado pela perda de neurônios produtores de dopamina na substância negra do cérebro. Isso leva a sintomas motores como tremores em repouso, rigidez muscular, lentidão de movimentos e instabilidade postural, além de manifestações não motoras como depressão acentuada, distúrbios graves do sono e demência. Ou seja, Parkinson é amplamente incapacitante para o ser humano, pois compromete progressivamente a mobilidade, a autonomia e a qualidade de vida ao longo de sua dolorosa evolução.
Bolsonaro tem problemas abdominais decorrentes de lesões no intestino, que eventualmente apresenta obstruções. O fato é que, por exemplo, até pessoas ostomizadas, ou seja, que utilizam bolsas de colostomia do lado de fora corpo, como ele próprio usou por um período após suas cirurgias, podem cumprir pena em estabelecimentos prisionais. O Plano Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade (PNAISP), uma Portaria Interministerial sob o nº 1777/2003, prevê atendimento para apenados com suas características. Aliás, além de pessoas fazendo uso de bolsa de colostomia, até cadeirantes e amputados cumprem penas em presídios de todo o país, tendo, naturalmente, uma atenção à saúde diferenciada.
O laudo apresentado por Collor para cumprir pena em prisão domiciliar foi estritamente técnico, formado por dezenas de páginas, com a inclusão de inúmeros exames, um arcabouço que ainda assim foi profundamente escrutinado pelos ministros do STF. No caso de Bolsonaro, seus advogados não escondem de ninguém, falando inclusive com a imprensa, que tentam de todas as formas achar uma “saída” para que seu cliente não fique na Papuda. Na prática, eles assumem que busca um subterfúgio, uma brecha, para deixá-lo em casa, chegando a afirmar que se o extremista for mandado para cumprir pena na penitenciária “terá um piripaque”, o que “obrigará” o Supremo a mandá-lo de volta para a mansão onde vive. O que fazem, em termos reais, é ameaçar a Corte, tendo em vista que nenhum condenado pode “obrigar” o Judiciário a realizar o que ele quer sob pena de ficar fazendo birra ou simulando chiliques.
Diante disso, a Fórum apurou que Alexandre de Moraes não será condescendente com essa prática. Qualquer coisa que vier de médicos poderá ser analisada e submetida à apreciação de uma junta médica determinada pela Justiça. Inclusive, até mesmo antes da apresentação do tal laudo, o ministro poderá exigir que a avaliação seja realizada por pessoal médico independente. A informação é clara: o ministro tem ciência perfeitamente que tudo leva a crer que se trata de uma manobra, e, comprovado isso, não liberará Bolsonaro para cumprir pena em casa.
A coisa vai além. A apuração da Fórum também aponta para uma manutenção da prisão do ex-presidente no Complexo Penitenciário da Papuda se essa discussão for levada à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. Os ministros Flávio Dino e Cármen Lúcia, assim como Moraes, não estaria dispostos a ceder a essa manobra simplesmente para equiparar o condenado ao outro ex-presidente. Quanto ao voto do ministro Cristiano Zanin, não foi possível apurar como ele seria.
O clima poderia apenas mudar de figura se o pedido, por questão regimental, fosse levado ao plenário do STF. Nesse caso, pela existência de votos alinhados a Bolsonaro, como os dos ministros André Mendonça, Kássio Nunes Marques e Luiz Fux, é possível que Moraes deixasse a posição mais rígida em relação o cumprimento de pena na cadeia para que o condenado então pudesse voltar para o regime domiciliar, evitando desgastes com os colegas de tribunal.
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